Toda classe, grupo ou estereótipo tem
algum tipo de representação simbólica. Seja um elemento natural, um caractere,
uma flâmula ou um brasão, a ideia se expressará diretamente, subjetivamente ou
metaforicamente. No gráfico, no multi dimensional ou mesmo no imaginário, a
apresentação se impõe figurante. Porém, há aquelas simbologias estigmatizadas,
que nascidas do vurmo contra cultural, são tão significantes quanto a escuridão
para a claridade.
No ano de 1992, quando o Clube dos
Quadrinheiros de Manaus foi criado, a missão de elaboração de seu símbolo, foi
delegada ao artista plástico/desenhista/poeta João Castilho Neto. Em poucos
dias, o mestre que na época contava com 42 anos de idade[1], apareceu em reunião deste grupo com o
produto final. A forma circular com o nome Clube
dos Quadrinheiros de Manaus rodeando
o desenho, mostrou-se ideal para sua aplicação propagandista e qualquer outro
tipo de atribuição. A técnica era do preto
e branco simples, na mais
fiel referência à arte autoral. O desenho em si, um animal lendo uma revista em
quadrinhos. Diga-se de passagem que, ler histórias em quadrinhos é a conjugação
que melhor define o ser quadrinheiro[2]. O bicho, um urubu. A logomarca foi acatada
unanimemente.
No decorrer de todos esses anos, o Clube
dos Quadrinheiros de Manaus ganhou muitas negações do poder público e privado
em suas empreitadas independentes, como um urubu discriminado pela grande
maioria. O quadrinheiro,
membro do Clube, dificilmente é convidado para algum tipo de parceria.
Exatamente como o urubu, um “marginal” do reino animal, que não chega nem a ser
caçado por ter carne indigesta (a única vantagem disto é não ter predador
natural). Por muitas vezes, sem nenhum tipo de recurso, o quadrinheiro, membro do Clube,
usa da criatividade, fazendo reaproveitamento e reciclagens de suas ferramentas
e de suas técnicas, para finalizar suas obras. Assim como o urubu, que encontra
em qualquer canto seu lar e em qualquer lixeira seu alimento. No seu
amadurecimento, o quadrinheiro,
membro do Clube, corrige erros de seu passado e explana sua experiência em
busca de profissionalização e dignidade em seus feitos contemporâneos[3]. Bem como o urubu que, no planar de seu
voo tranquilo, espreita sereno a todos à quilômetros de altura.
Até hoje ainda há quem não se identifique
com a nobreza deste ovíparo singular e mesmo quem não compreenda seu simbolismo
lírico urbano. Contudo, as gerações se renovam num ciclo infindável de quadrinheiros do Clube, que tomam novos rumos,
com o passar do tempo e de outros que chegam, com grande fome de produzir algo
e agregar, portando camisetas nerds,
escutando The Clash e lendo Baudelaire. Logo, não é difícil chegar a conclusão
de que nenhum outro animal ilustra com tal perfeição o Clube dos Quadrinheiros
de Manaus, como o urubu. Afinal, desprezado ou não, se trata de um animal que,
como outro qualquer, só vive o direito de manter sua espécie.
Lembrem-se que enquanto houver claridade,
haverá a escuridão, com todos os seus elementos pertinentes. Como diriam os
Titãs, “...oncinha pintada, zebrinha listrada, coelinho peludo, vão se...”.
Por: Mário Orestes Silva
[1] Até a publicação deste texto, Castilho
ainda continua em plena produção artística em Mogi das Cruzes, interior de São
Paulo.
[2] Quadrinhista ou Quadrinista,
é o nome dado àquele que faz histórias em quadrinhos, a profissão. Quadrinheiro é o termo que significa aquele que
compra, coleciona, cultua ou simplesmente lê histórias em quadrinhos.
[3] O Clube dos Quadrinheiros de Manaus acaba
de adquirir seu Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica – CNPJ.
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